#CuraGay

Quando eu nasci, era branquela com olhos escuros e cabelo clarinho, clarinho. Quando eu tinha 3 aninhos, meu cabelo já era escuro e todo cacheado. Quando eu tinha 6 anos, descobri que tinha um problema na musculatura ocular que só me permitia enxergar se eu virasse a cabeça para o lado direito. Operei meus olhos ainda criança. Lembro da cotovelada que o Leonardo deu no jogador dos EUA no jogo do dia 4 de julho de 1994: Era meu aniversário nesse dia; Brasil ganhou nesse dia; meu avô faleceu nesse dia.  Ganhei meu primeiro concurso de poesia aos 13 anos. Rolei a escada no meio do cerimonial da minha festa de 15 anos, com vestido longo branco e taça de prosseco na mão. Tomei meu primeiro porre com 16 anos, na primeira vez que viajei sem meus pais. Ganhei meu primeiro salário aos 17 anos. Tirei 2 tumores da tíbia esquerda com 18 anos. Eu fiquei toda encharcada na faculdade depois que um amigo despejou um extintor de incêndio de água em mim, aos 19 anos. Eu tentei escalar o telhado da faculdade que nem Gabriela para buscar meu sapato -que um amigo havia atirado lá-, aos 21 anos. Eu tirei fotos do convite de formatura usando beca e óculos escuros pra disfarçar a ressaca, quando eu tinha 22 anos. Em consequência de tudo isso, eu fui alvo de um abaixo-assinado (da minha própria turma!) para ser expulsa da faculdade, também aos 22 anos. Mas eu sempre fui ótima aluna e passei com nota 10 na temida prova da OAB. Eu me matriculei em nada menos do que 8 academias desde 23 anos (e nunca frequentei por mais de 3 meses). Eu namorei, planejei noivado, comecei a fazer enxoval e joguei tudo pro alto, aos 25 anos. Eu fui a quase todos os jogos do Flamengo em 2009, quando tinha 26 anos (e chorei muito naquela final do Brasileiro). Eu subi no palco e dancei funk com um desconhecido Naldo no meu aniversário de 27 anos. Eu passei a trabalhar num Centro Umbandista quando eu tinha 28 anos. Eu ganhei meu primeiro Carnaval com a minha Vila Isabel aos 29 anos (e chorei muito). E cá estou eu, prestes a completar 30 anos.

Eu tenho uma vida que não é igual à sua. Mas é tão normal que até poderia ser a vida de alguns dos meus amigos heterossexuais. Poderia ser a vida de outros tantos amigos homossexuais que eu tenho. Poderia até ser igual à sua vida. E você sabe por quê? Porque a opção sexual não me difere de ninguém. O que me difere é o caráter.

Essa sou eu, Christiane Leite, muito prazer. Brasileira, carioca, flamenguista, advogada, três vezes pós-graduada, heterossexual, branquela, baixinha e umbandista. E a #CuraGay não me representa.

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